Editorial: Proteção contra o Estado policial

O Globo

Na Era Lula, a Polícia Federal intensificou operações, batizadas quase sempre com nomes criativos, contra sonegadores e acusados de crimes financeiros. Batidas dadas por policiais sempre fortemente armados costumavam ser concluídas com donos de empresas, diretores e gerentes devidamente algemados e na caçamba de camburões.

Tudo era registrado pela imprensa — sempre pautada com a devida antecedência —, para as cenas aparecerem nos jornais das TVs à noite e estampadas nas primeiras páginas dos jornais do dia seguinte.

Ao perceber que aquelas operações rendiam popularidade, a PF, subordinada ao Ministério da Justiça, intensificou as ações, até que surgiram os primeiros questionamentos. Um deles, um número ínfimo daquelas pessoas tratadas como perigosos meliantes era de fato condenado. Muitas vezes por vícios na condução do inquérito policial, detectados pela Justiça, as acusações eram, e são, retiradas.

Depois, diante das críticas, a PF teve de parar de apresentar suspeitos como se fossem bandidos, e até o uso da algema foi regulado. Impôs-se, em boa hora, o direito constitucional à privacidade e à presunção da inocência.

Mas seria na Operação Satiagraha, contra o banqueiro Daniel Dantas, conduzida pela PF, com apoio na primeira instância da Justiça e no Ministério Público, que surgiu por inteiro o funcionamento de um braço policial clandestino em operação dentro do Estado brasileiro.

O delegado da PF Protógenes Queiróz mobilizou ilegalmente agentes da Abin, conseguiu grampear pessoas também à margem da lei, e assim foi, até ser destituído das investigações, e sair da PF para fazer carreira política (aliás, por que já não começou desde cedo nela?).

Este é o contexto da importante decisão tomada terça-feira pelo Supremo Tribunal Federal de que a Receita Federal só pode ter acesso a informações sigilosas dos contribuintes se conseguir permissão da Justiça. Foi, na verdade, a revisão de um veredicto anterior do próprio STF, lavrado no final de novembro.

Os ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa mudaram de posição no julgamento do caso em que uma empresa — GVA Indústria e Comércio — reclamou na Justiça que a Receita requisitara do banco de que é cliente, o Santander, informações confidenciais sobre sua movimentação financeira. Aplauda-se o Supremo.


Luiz Vasconcelos

O redator do blog tem formação acadêmica pela Universidade Estadual do Ceará na área de Pedagogia, no entanto, tem grande predileção pelo jornalismo.

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